Documento enervante traça o perfil de três dissidentes anti-Putin

O presidente russo, Vladimir Putin, pode ser absolutamente terrível para o mundo, mas é uma dádiva perversa ao gênero documentário. Além dos numerosos filmes que mostram os horrores da guerra na Ucrânia, há um crescente subgénero de filmes de não-ficção sobre indivíduos corajosos que arriscam as suas vidas para lutar contra o seu regime. O mais recente é o novo documentário de James Jones (Chernobyl: as fitas perdidas), que serve como complemento não oficial do filme vencedor do Oscar Navalny. Recebendo sua estreia mundial no Tribeca Film Festival, o filme ironicamente intitulado Antídoto fornece mais um lembrete perturbador dos males do actual regime russo.

Uma das coisas que necessitam de antídoto é, obviamente, o veneno, que aparece com destaque no filme. Um dos seus sujeitos é um cientista russo anónimo, cujas características são distorcidas através de uma técnica chamada “véu digital” (fale sobre uma indústria em crescimento). Sua especialidade era o desenvolvimento de novos venenos, produto no qual o governo russo tinha bastante interesse. Quando percebeu que as suas criações não estavam a ser usadas contra terroristas, mas sim contra opositores políticos e dissidentes, começou a denunciar anonimamente. Não surpreendentemente, ele logo se viu forçado a deixar o país, embora sua família não pudesse acompanhá-lo imediatamente.

Antídoto

O resultado final

Um thriller infeliz da vida real.

Local: Tribeca Film Festival (Competição de Documentário)
Diretor:James Jones

1 hora e 29 minutos

O documentário concentra-se em grande parte em alguém que é bastante visível – Christo Grozev, um repórter investigativo búlgaro ligado a grupos jornalísticos como Bellingcat e The Insider. Há vários anos, ele liderou a investigação sobre o envenenamento de Navalny e esteve envolvido no documentário subsequente. Infelizmente, ter um perfil tão elevado não ajuda quando se trata de lidar com Putin. Grozev foi forçado a deixar Viena, onde morava. Na cena de abertura do filme, ele é visto ao telefone com o pai, informando que tem informações confiáveis ​​​​de que se retornar à Áustria será morto.

Acusado de caluniar o exército russo (você sabe o quanto eles são sensíveis), Grozev vive no exílio, temendo constantemente por sua vida e pela de seu pai. Um dos locutores do filme, Roman Dobrokhotov, colaborador do The Insider, diz: “Se eu fosse Putin, com certeza mataria a mim e a Christo Grozov. Sem nenhuma dúvida.”

Muito parecido com o documentário Navalnyque retratava as ameaças contra ele no momento em que aconteciam, Antídoto rastreia Grozev, que fica preocupado quando não consegue falar com seu pai por telefone por vários dias. Seus piores temores se concretizam quando ele contata a polícia local e descobre que seu pai morreu repentinamente. Os resultados da autópsia são inconclusivos, levando-o a se perguntar se seu pai foi assassinado ou se foi o estresse da preocupação com o filho que o matou.

“Meu problema é que, de qualquer forma, me sinto culpado”, diz Grozev. “Porque se eu não estivesse fazendo o que estou fazendo, ele estaria vivo agora.”

Outro líder da oposição russa que aparece com destaque no filme, embora apenas nas imagens noticiosas, é Vladimir Kara-Murza, que sobreviveu não a um, mas a dois ataques de envenenamento. Ele acabou sendo preso e acusado de alta traição, pela qual cumpre agora uma pena de 25 anos numa prisão siberiana.

“Sinistro nem é a palavra certa”, comenta sua esposa Evgenia sobre Putin. Desde a prisão do marido, ela tornou-se uma voz proeminente da oposição, vivendo nos Estados Unidos, mas falando frequentemente a nível internacional para manter o interesse público na situação do seu marido.

Os jornalistas entrevistados no filme não medem palavras. “Putin é um psicopata”, declara um, enquanto outro comenta que a Rússia já nem sequer se preocupa em fingir que é um Estado democrático. Grozev, por sua vez, vive em constante estado de ansiedade, sabendo que poderá ser assassinado a qualquer momento. “A única esperança é que este regime caia antes que a ordem seja cumprida por alguém”, diz ele com ar de resignação.

Hollywood Reporter.